Sobre o empreender artesanal

Para além do business plan

Sabemos que o fazer artesanal tem múltiplos sinônimos ligados ao cotidiano, à autopercepção e à relação com o outro e com o mundo: criar, manusear, cozinhar, limpar, arrumar, escolher, preparar, descartar… Hoje queremos olhar para o sentido do fazer vestido de empreender – este verbo controverso que nos coloca num lugar de trabalho que parece distante do universo artesanal. Isso porque no ambiente do empreender começaram a morar as palavras realizar, escalar, automatizar, viabilizar, padronizar, operacionalizar e todos os anglicismos de business.

O empreender artesanal apresenta uma fronteira tênue entre o universo das artes e o dos negócios. É onde moram os fazedores que se dedicam à própria arte ao mesmo tempo que cuidam da sustentação de si e da ponte que criam para oferecer seus fazeres ao mundo. São artesãos de sua arte e também dos fazeres necessários para sustentá-la. É um aprendiz que costuma desejar imprimir na jornada empreendedora seu modo de fazer. Diferente de um autônomo que foca em seu servir, o empreendedor artesanal deseja não apenas realizar sua arte, mas se realizar através dela. Seu ato criativo vai além do centro de sua entrega em termos de produtos e serviços, está também em tudo que orbita seu fazer: como se fazendo seus “o quês” e seus “comos” criasse um “onde” possível, um mundo onde possa manifestar sua arte.

Para sustentar seu projeto no mundo, o empreendedor artesanal sabe que seu projeto vai além do business plan; envolve acreditar em si e no que faz e agir com consistência; expandir e fazer junto para polinizar sua mensagem; e nutrir consciência do impacto do seu fazer para si mesmo e para o mundo (do ponto de vista ecológico, psicoemocional e financeiro).  

Começar empreender a própria arte no mundo não envolve apenas fazer o que se ama. Implica, antes, fazer algo que não se pode deixar de fazer e lidar com dois desafios essenciais: saber que não há nada posto (dado) e que não fica pronto (acabado). Não é um nicho em que o empreendedor se encaixa ou uma filial de um modelo pronto para operar um negócio. É um lugar que depende de um mapeamento contínuo, para seguir construindo, fazendo, errando e se confrontando com todos os fazeres que envolvem o empreender. É terreno de constante revolução de si e da potência dos próprios fazeres. O empreender artesanal também é espaço de despertar do fazer(se). A partir do dia 15 de setembro vamos encontrar outros fazedores artesanais (empreendedores ou não) para viver juntos experiências manuais e observar o que nos acontece no processo do fazer. Conheça este processo inédito da Revolução Artesanal e participe!

Escrita artesanal por Carolina Messias com Ciça Costa e Bruno Andreoni

ARTESANAL - MANIFESTO

As mãos como ponte dos afetos de dentro para fora
dão forma ao pensamento, à singular expressão.

O artesanal mobiliza o que há de mais humano em nós:
imaginar, criar e fazer,
dar sentido às emoções, memórias, relações,
dar formas, cores, sabores, funções,
dar movimento e beleza.

Nosso ativismo artesanal acontece no “fazendo”:
no olhar sobre e para o mundo,
na escolha de como consumimos e ocupamos o mundo,
na valorização do pequeno, do local e do autoral,
no manejo do corpo com as ferramentas e os materiais,
no aprendizado com o erro, a repetição e o tempo do fazer,
no contato com a natureza e nossas raízes artesãs.

É no “fazendo” que nos colocamos
corajosamente em atrito com o nosso fazer;
é no “fazendo” que transformamos
as coisas, a nós mesmos e o mundo para,
aos poucos,
reacender a sabedoria que está dentro de nós,
de cada um de nós,
de nossa ancestralidade e
do que queremos criar com sentido neste mundo.

Por um mundo feito à mão, um mundo feito por nós!