Relações Artesanais e suas cores

Somos feitos de linguagem construída a base de histórias nas relações parentais, amorosas e de amizades e com uma cola chamada tempo que vai, com algumas falhas, fazendo um quebra-cabeça de uma coisa com a outra: ali, ele cola uma pecinha de afeto, lá, uma de desafeto, outra de amor, escuta, carinho, desamparo… Com o passar dos anos, entendemos que esses encaixes estão em todas as relações e, se não fosse a linguagem e o tempo nos dando essas pistas, talvez nem entenderíamos que eles são sentimentos. O mais intenso de tudo: nenhum deles existiria se não tivéssemos nos relacionado com os outros. 

Nossas experiências com o mundo e a forma com que interagimos com ele têm uma representação gigantesca em quem somos e nos tornamos. Cada relação que passa é uma marca que o tempo deixa. 

Os vínculos nos dão notícia de alguma coisa antes não descoberta. É só a partir deles que criamos a nossa própria realidade. Que pulsante! Precisamos de alguém que chegue, nos encontre e nos presenteie com alguma coisa sobre o mundo real. Nem sempre é lindo. O outro também nos frustra, nos decepciona, nos abandona. Bom, é quando colocamos as partes nem tão boas na mala e seguimos tocando a vida.

Acontece que as belezas, delicadezas e tristezas que as relações nos trazem têm sido minimizadas pelo consumo irresponsável. O tempo que tínhamos pra colar mais pecinhas no nosso quebra-cabeça infinito vai sendo gasto com produtos dispensáveis ou peças de roupas e acessórios que desconsideram qualquer relação com quem os produziu… Aí é que perdemos a convivência com as pessoas que amamos e passamos a nos dedicar a objetos que compramos.

A relação artesanal é subversiva ao consumo sem consciênciae nos traz de volta a esse plano afetuoso consigo e com o mundo. Ela nos ajuda a tatear o que é envolver corpo inteiro, pré-disposição e mais dedicação nas relações que nos envolvemos.Ela nos ensina a questionar: quem produziu isso que consumo? Quais são as cores daqui? Quais foram os aprendizados durante a produção? Tem algo aqui que desconheço? A relação artesanal coloca nosso olhar sobre quem criou o que consumimos e pode nos convidar a criar junto. O belo pode voltar de um outro jeito muito mais pigmentado em objetos, roupas e acessórios, dentro das nossas florestas, das memórias ancestrais, dos nossos alimentos.

Rumando a possibilidade de mais conhecimentos compartilhados e relações artesanais vividas em grupo, fica o convite para o Lab Cor, uma vivência na Floresta Amazônica, na Comunidade Santa Helena do Inglês – RDS Rio Negro, para o contato com a marcenaria local, tecelagem e tingimento multicoloridos. Dobras, desenhos, impressões botânicas… tudo nas nossas mãos! E também viver a relação com a Floresta Mãe, o povo ribeirinho, os Seres Encantados, a Amazônia.


O Lab Cor (Laboratório Cores da Floresta), acontece entre os dias 14 e 20 de janeiro/2024. As inscrições estão abertas e você pode descobrir e se descobrir nesse lugar.  O número de vagas é pequeno, de 6 a 8 pessoas. Queremos muito te ver por lá.

 

Para saber mais e se inscrever acesse aqui >>>

Para compreender o outro, é preciso se relacionar com a comunidade.
Para compreender a si, é preciso colocar os óculos coloridos.
Para compreender a Amazônia, é preciso se relacionar com Floresta.

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Escrita artesanal por Mali Vicentis com Ciça e Bruno

ARTESANAL - MANIFESTO

As mãos como ponte dos afetos de dentro para fora
dão forma ao pensamento, à singular expressão.

O artesanal mobiliza o que há de mais humano em nós:
imaginar, criar e fazer,
dar sentido às emoções, memórias, relações,
dar formas, cores, sabores, funções,
dar movimento e beleza.

Nosso ativismo artesanal acontece no “fazendo”:
no olhar sobre e para o mundo,
na escolha de como consumimos e ocupamos o mundo,
na valorização do pequeno, do local e do autoral,
no manejo do corpo com as ferramentas e os materiais,
no aprendizado com o erro, a repetição e o tempo do fazer,
no contato com a natureza e nossas raízes artesãs.

É no “fazendo” que nos colocamos
corajosamente em atrito com o nosso fazer;
é no “fazendo” que transformamos
as coisas, a nós mesmos e o mundo para,
aos poucos,
reacender a sabedoria que está dentro de nós,
de cada um de nós,
de nossa ancestralidade e
do que queremos criar com sentido neste mundo.

Por um mundo feito à mão, um mundo feito por nós!