Quando mãos artesãs se encontram

O poeta Vinícius já cantou no Samba da Bênção que “a vida não é brincadeira, amigo. A vida é arte do encontro. Embora haja tanto desencontro pela vida”. Mas como acontece essa arte do encontro? O encontro se dá para além das palavras, do convite falado ou escrito. Também não basta apenas a presença (seja física, seja virtual) de pessoas no mesmo lugar. Encontrar-se com o outro envolve intenção compartilhada e uma alquimia de afetos: de si com o outro, de si e de todos com o que está ao redor – afetos e percepções que mobilizam algo em nós.

Foi essa a arte do encontro vivida por Ciça Costa na Amazônia em janeiro de 2020. Ela abriu sua casa em Tumbira para um encontro com a comunidade local para oferecer uma vivência de tingimento natural, mas foi além do convite, ela foi ao encontro das pessoas: bateu na porta das pessoas para convidá-las, envolveu-as experiência, ouviu suas histórias e saberes e honrou a colaboração delas para promover a sua oficina. Em vez de “realizar” o Laboratório de Cores, ela permitiu que ele se realizasse através dos encontros: das pessoas que convidou, das ofertas que elas lhe fizeram, das descobertas e até da mesa de café que preparou para recebê-las. A ideia de fazer um bolo surgiu de perceber a quantidade de cupuaçu disponível ao redor de sua casa. Ela não tinha receita de bolo de cupuaçu, mas tinha a de sua mãe – e assim promoveu o encontro de um produto local com uma receita tradicional de sua família. O cupuaçu também “a convidou” a preparar um suco para as convidadas do laboratório. Abrindo-se para o que estava disponível naquele momento, ela encontrou possibilidades de criar algo novo para ela, mesclando saberes seus com a experimentação.

Na foto: Maria José, Isabel e Vera Garrido

Naquela tarde na casinha da Amazônia, as mãos artesãs se encontraram, trocando saberes, experiências para além da técnica do tingimento natural. É esta a experiência do Laboratório de Cores: do convite à recepção, do espaço aos fazeres, a arte do encontro é semeada e dá lugar à fluidez, à criatividade, à convivência. Quando as mãos artesãs se encontram no Laboratório de Cores, elas não colorem só os tecidos e as mãos; elas permitem perceber cores locais, unem corações, modos de ser e, sobretudo, elas abençoam a arte de conviver.   

Convidamos você a vivenciar essa arte em julho! Estamos formando um grupo para viver por uma semana em nossa casa artesanal, encontrando saberes de uma comunidade ribeira do Rio Negro-AM em forma de pessoas, sabores, cores, palavras. Lá a proposta é conviver com saberes e fazeres em conexão com aprendizados simples, naturais e ancestrais. Mãos e corações que acreditam na potência do artesanal, da conexão com a terra e do que nasce do fazer junto, em comunidade.

Sentiu o chamado para este encontro? Queremos contar mais sobre esta vivência na Amazônia e esta arte de conviver com a floresta e na comunidade. Envie uma mensagem para contato@revolucaoartesanal.com.br ou whatsapp para 11 999738603 – Ciça

Escrita artesanal por Carolina Messias, com Ciça Costa.
Na foto de capa, D. Vitalina que, com sua sabedoria, nos levará pela floresta para colheita de matéria-prima tintória e medicinal.

ARTESANAL - MANIFESTO

As mãos como ponte dos afetos de dentro para fora
dão forma ao pensamento, à singular expressão.

O artesanal mobiliza o que há de mais humano em nós:
imaginar, criar e fazer,
dar sentido às emoções, memórias, relações,
dar formas, cores, sabores, funções,
dar movimento e beleza.

Nosso ativismo artesanal acontece no “fazendo”:
no olhar sobre e para o mundo,
na escolha de como consumimos e ocupamos o mundo,
na valorização do pequeno, do local e do autoral,
no manejo do corpo com as ferramentas e os materiais,
no aprendizado com o erro, a repetição e o tempo do fazer,
no contato com a natureza e nossas raízes artesãs.

É no “fazendo” que nos colocamos
corajosamente em atrito com o nosso fazer;
é no “fazendo” que transformamos
as coisas, a nós mesmos e o mundo para,
aos poucos,
reacender a sabedoria que está dentro de nós,
de cada um de nós,
de nossa ancestralidade e
do que queremos criar com sentido neste mundo.

Por um mundo feito à mão, um mundo feito por nós!