Em junho/2019 aconteceu o Festival do Fazer. Dois dias intensos de muita potência e criação. O momento do festival passou deixando muitas sementes plantadas para alimentar o movimento da revolução artesanal que não pára! Ainda inspirada pela roda de conversa da qual tive o prazer de participar, escrevo algumas palavras caminhando no fluxo do movimento…
O futuro é feito a mão e a revolução é artesanal. Duas afirmações que parecem se chocar com a ideia de futuro amplamente divulgada em nossos tempos: o futuro da tecnologia.
A primeira vista, parece que o terreno atual para plantarmos nossas sementes do festival é muito árido. O discurso e a cabeça da tecnologia tomam todos os espaços, a política, a saúde, a educação, a cultura, a economia, tudo!
Contudo, o slogan que se vê caminhar junto com a construção e divulgação desse futuro tecnológico é o “better toghether”, inteligência artificial caminhando junto com a inteligência humana. Como?
Muito se houve falar do desenvolvimento das tecnologias e pouco se ouve e se pesquisa sobre a inteligência humana. Muito menos se ouve falar de como elas poderiam caminhar juntas!
Tudo o que chamamos de tecnologia foi criado pelo ser humano. E todos os modos de uso também. Tudo o que nos encanta e nos assombra sobre a tecnologia e seus futuros possíveis são facetas humanas. Algumas que reconhecemos e outras que não queremos lidar. Mas são todas escolhas nossas.
Na época da revolução industrial vivemos um momento muito parecido com o de agora. O ser humano estaria liberado de uma série de tarefas mecânicas para seguir seu processo de humanização. Nas décadas seguintes tivemos um ensaio do que poderia ter sido isso. Vários movimentos se desenharam para o despertar da consciência, práticas de conexão com a natureza, experiência de estados alterados de consciência, expansão nos modos de relação entre as pessoas, revisão de valores, músicas, poesia.
O movimento teve seu impacto, mas forças adversas a esse movimento conseguiram transforma-lo em algo “excêntrico” e deixá-lo circunscrito na história como uma “maluquice de jovens”. E o que imperou foi o apego da maioria ao conforto, status e modus operandi vigente já conquistado e instalado. Pouco se desenvolveu, desde então, sobre o que seria o tal processo de humanização.
O que se sabe é que não conseguimos dar o salto como humanidade num processo de humanização e nos tornamos máquinas super eficientes. Máquinas de trabalhar, máquinas de se relacionar, máquinas de estudar e máquinas de usar outras máquinas tecnológicas. A era da revolução industrial se cumpriu. O pensamento industrial vigente capturou o capitalismo que a tudo captura. E tivemos um desenvolvimento imenso da indústria do ensino, da indústria alimentícia, da indústria da moda, da indústria do agronegócio, da indústria dos relacionamentos com seus apps e modismos, indústria da religião, indústria da qualidade de vida, etc. Todas as facetas foram tão bem capturadas que hoje vivemos, inclusive, uma escassez de termos para conversarmos livremente sem correr o risco de falar uma palavra e ser totalmente mal entendido ou trazer uma série de paradigmas que não correspondem ao que está sendo dito. É preciso garimpar nossas raízes para saber atravessar todas as barreiras limitadoras que construímos. Saber a origem e a amplitude de nossa língua brasileira já é um ponto de nosso processo de humanização.
Mas continuando… como máquinas, a inteligência artificial é mesmo capaz de nos superar, pois sabe usar totalmente seu potencial. E nós, estamos longe de reconhecer nosso potencial.
E agora, novamente ouvimos algo muito parecido: revolução tecnológica. A tecnologia vem para substituir funções, conectar mais pessoas e nos levar para o futuro.
Vamos nos distanciando tanto dos fatos da vida que nos esquecemos inclusive que são pessoas que criam as tecnologias, e as indústrias e o capitalismo e todos os pensamentos associados a essas ideias. Logo, tudo o que estamos vivendo hoje são também possibilidades humanas. A que parte de nós estes fatos se relacionam? Algo que podemos nos tornar, algo que está em potencial em nós. Temos também pontos de conexão com estes tipos de força que compõe tais desfechos. Ou não! Há sempre a escolha.
Sempre temos escolha. Embora todas as mensagens das mídias pareçam dizer o oposto. Gostam de nos confundir falando de massa com nome de coletivo.
Massa são indivíduos máquinas, manipulados. Coletivo são singularidades, indivíduos com uma noção de individuação que sabem que podem somar. Sabem que sempre somamos, com uma coisa ou com outra. E então essa é uma boa pergunta a se fazer: com o que estou somando?
Estou somando com essa massa de manobra aceitando todas as verdades sem questionar? Apenas temendo um futuro tenebroso sem poder modificá-lo? Esse é um outro aspecto da massa, nos coloca em um lugar de impotência. O outro, seja o outro o governo, a tecnologia, a sociedade, o mundo…, sempre detém o poder e comanda o mundo. Um mundo que acredita é feito por todos os “outros”.
Num coletivo lidamos com a noção de potencial e suas relações possíveis, ao invés do poder e controle.
Num coletivo, sabemos que cada singularidade é criadora de sua realidade, e soma. O mundo que eu posso mudar, é o meu. O mundo a que eu tenho acesso, é o meu. O mundo que eu crio, é o meu, feito com minhas próprias mãos.
O futuro, só pode ser feito à mão, porque as ações são soberanas. Para além de qualquer discurso, sonho, preocupação, o que de fato existe é o que eu fiz. O que eu faço. Para se ter essa noção, tenho que estar conectado com minha potência. Tenho que ter noção que me construo junto com minha história. É preciso saber que as notícias que ouço, as previsões de futuro que são divulgadas, as tendências, tenho sempre a possibilidade de reflexão e escolha. E se eu estiver atento, consciente desse processo de autoconhecimento e construção de si, aí sim serei criador de uma realidade. E poderei gerar impactos benéficos.
As pessoas que escolherem não se conectar e se responsabilizar serão criaturas de outros criadores.
Nesse movimento de conexão, responsabilidade e criação, surge uma revolução possível. Uma revolução artesanal.
A verdadeira revolução, na minha opinião, é a conexão de cada um com seu potencial, é a descoberta do amor. A descoberta de que a união faz a força, de que todos têm seu lugar ao sol.
Revolução esta que é semeada, incubada, gestada e germinada artesanalmente dentro de cada um. Com as águas, os humores e os valores de cada pessoa. Que se torna responsável por suas escolhas e num dado momento, passa a vivê-las e compartilhá-las.
O que nos falta é saber mais sobre as potencialidades humanas, sobre a energia do amor, sobre nossas energias que constroem nossos corpos, que são capazes de recarregar inclusive celulares super tecnológicos! Que energias são essas? Que potencial é esse? Afinal, o que é a inteligência humana? E o que seria nosso processo de humanização?
Continuando no movimento…vamos conversar mais, ler mais, pesquisar mais e escrever mais! Em breve podemos trocar mais textos sobre a inteligência humana. Por enquanto, o convite é o questionamento! Veja quais são suas boas perguntas que vão lhe abrir uma estrada de novos questionamentos e possibilidades de movimento e criação.
Com carinho, Melissa